domingo, 4 de janeiro de 2009

Intolerância religiosa e a complexa questão da diversidade cultural

Abaixo segue um texto publicado no site do Jornal de Angola no qual o autor João Pinto aborda o tema da intolerância religiosa sob o ponto de vista africano. Parece que a globalização nos apresenta também de forma única as dificuldades de respeito e aceitação do ser humano. O texto abaixo está apresentado na íntegra e pode ser encontrado no site do Jornal de Angola.

Intolerância religiosa e a complexa questão da diversidade cultural

A intolerância religiosa é o desconforto resultante da não-aceitação das convicções religiosas de outro, respeito pelas opções dos outros, pondo em causa a sua liberdade de escolha, dignidade e consequente responsabilidade como ser humano racional e sensível à transcendência.

A humanidade resulta de um longo processo histórico, onde a nação política, histórica, linguística e religiosa confundiam-se. Hoje, tais pressupostos estão ultrapassados, pois, as consequências da intolerância religiosa ou sociocultural teve efeitos nefastos, justificando actos bárbaros, desumanos ou irracionais, pondo em causa os padrões civilizacionais até então alcançados. O apogeu da intolerância sociocultural começa no Egipto, por desres-peito pelos judeus escravos na construção das pirâmides, o processo das guerras helénicas e imposição da sua civilização, os romanos com as colónias e perseguição dos cristãos, as guerras islâmicas de conquista, mas ela se torna repugnante com a escravatura sobre os africanos e a sua desumanização como processo estrutural de imposição de uma fé de matriz cristã, na óptica pauliniana1. Os regimes totalitários na busca do sonho de domínio e conspiração das minorias religiosas, organizou a perseguição contra os judeus na Alemanha Nazi, culminando com o extermínio de judeus em 1945, dando origem ao Estado Israelita em 1948 que infelizmente até ao preciso momento não está pacificado com os palestinianos de fé islâmica. O mundo dito globalizado tende por uma filosofia de matriz religiosa protestante, há um declínio da doutrina social da Igreja Católica ou Europeia, nas finanças e comércio há um domínio filosófico religioso judeu e cristão (calvinista), resultante do excesso de liberdade de opção, liberalismo, onde a solidariedade, a iniciativa e sucesso individual conflituam, vencendo os empreendedores, coisa que nem sempre é justa do ponto de vista social.

Liberdade cultural num mundo diversificado
As escolhas que os homens fazem e as responsabilidades das suas acções ou omissões, é o que podemos considerar como sendo a liberdade. A liberdade implica consciência, responsabilidade e ética ou respeito pela ordem sociocultural no mundo. Falar de liberdade cultural num mundo diversificado devemos atendermo-nos à pluralidade sociocultural, (racial, religiosa, linguística, política e económica) o mundo de hoje deve atender à diferença, inclusão ou protecção dos vulneráveis, igualdade, atendendo às identidades acima referidas. O estar e sentir dos homens resulta da sua essência, bem, mal, justo ou injusto, alegre ou triste são acções ou manifestação de emoções naturais no homem. As características somáticas (cor da pele, nariz, cabelo, olhos), a manifestação de tais aspectos ultrapassam a razão, são transcendentais ao homem, ultrapassa a vontade do indivíduo ou sujeito. Devemos com isto compreender os outros tal-qualmente os outros são. Ser universalista, relativista ou absolutista pouco importa, o que interessa é olharmos aos outros como são; a igualdade não implica identidade mas inclusão, atendendo olhar sobre os outros, se são religiosos ou não, se são claros ou escuros, se se vestem como nós ou não. A liberdade cultural é o respeito pelos outros, convivermos, respeitarmos os outros mesmo quando diferentes de nós... Todos os povos têm os seus valores, sentido de bem ou de mal, justo ou injusto; mas o mundo globalizado é diversificado que, deve atender às especificidades, aos gostos estéticos ou artísticos, à filosofia, é técnica ao conhecimento. Uns são altos, baixos, magros, gordos, claros, escuros, homens, mulheres, belos e feios. O respeito pelos outros é um imperativo de humanismo para um convívio sadio e equilibrado. Ignorar as diferenças culturais é conflituar, é provocar os outros, tendo como consequência a guerra, injustiça ou arbitrariedades(2). Só com aceitação aos outros vamos contribuir pela diversidade cultural ou equilíbrio social. 

Liberdade Cultural e Democracia
A democracia contemporânea tende pela aceitação, respeito e inclusão dos diferentes. Não se pode ser democrata quando não res-peitamos as premissas da igualdade, pluralidade cultural e solidariedade. Estes pressupostos resultam da liberdade de opção, consciência e consequente manifestação do seu estar e sentir ou sua espiritualidade, arte, língua e religião. A democracia resulta na esco-lha dos governantes com um número significativo de indivíduos livres, secretamente participam ou influenciam na escolha das elites governantes. Ora, democracia e liberdade cultural são pressupostos do pluralismo ou multiculturalismo vide artigos 1º , 2º, 18º da DUDH (3); 1º, 2º, 3º da CADHP (4). Cabe-nos olhar para os referidos direitos culturais como um dever do Estado garantindo a coesão social, económica e cultural vide artigo 7º , 18º e 49º da Lei Constitucional. Garantir a liberdade cultural é efectivar a igualdade entre homens, pessoas, seres cônscios dos seus direitos e deveres, coarctar, amputar e discriminar negativamente, é racismo segundo o artigo 1º da Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial(5).

1 S. Paulo, defendia a conversão total e sem reserva, nova identidade, novo nome para a salvação, nas suas epístolas aos Romanos cap. VI.
2 Vide Relatório do PNUD, 2004, pág 40 s.s.
3 Declaração Universal dos Direitos do Homem, é direito fundamental material ex vi artigo 21 da lei Constitucional Angolana.
4 Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, aprovada pela Resolução nº 1/91 de 19 de Janeiro.D.R. nº 3, I série.ola ainda não aderiu.

Texto de João Pinto, publicado no Jornal de Angola em 07 de Dezembro de 2008.

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